
Há década e meia se tanto me surpreendi ao ver um sujeito citar A arte da guerra de Sun Tzu como se fora uma bíblia do capitalismo e um arrazoado de ideias para se vencer na vida competindo e destruindo adversários e inimigos.
Trata-se de uma distorção oportunista de um dos livros mais importantes do Taoísmo.
Depois percebi dezenas de indicações e de “análises” de A arte da guerra buscando acoplar a obra ao modo de ser capitalista-individualista.
Nada mais inoportuno!
O oportunismo liberal mantem-se intacto, como se vê neste artigo na Folha de São Paulo (UOL), hoje, “Como o livro de um general chinês sobre guerra ajuda a passar em concursos?”, de um sujeito chamado William Douglas.
Vale a pena destacar partes da série de bobagens que diz William Douglas:
“Assim como as guerras, os concursos são vencidos com estratégias e regras.”
“Em muitos casos, apenas a experimentação e a individualização poderão responder qual o melhor caminho a seguir, pesados sob o crivo da relação custo X benefício.”
“Para ter sucesso em concursos é preciso um mínimo de objetividade, foco e simplicidade. É preciso fazer escolhas e sacrifícios.”
“Para passar em concursos, ou obter qualquer outra forma de vitória, tenha coragem de se diminuir assim como o pássaro abaixa sua cabeça antes de levantar voo. Seja menos, e cresça mais.”
“Depois que tiver conquistado os vastos campos de centeio e conhecido as montanhas mais altas do mundo, então serás grande.”
“Depois da aprovação, festas serão novamente festas, e baladas, baladas. Para os que assim desejarem. Para outros, serão noites bem dormidas, passeios com a família, viagens.”
O X da questão
A despeito de ser um livro sobre guerra escrito (provavelmente) há mais de 2 mil anos, há algumas questões a serem ponderadas:
Primeiro: é bastante provável que A arte da guerra seja uma compilação de textos mais antigos.
Segundo: não se sabe ao certo se Lao Tse existiu, ou se a obra (a compilação) tenha sido “feita” por vários autores e ao longo de anos.
Terceiro: o despeito (como se disse acima) de tratar-se de um livro sobre guerra, ele não se presta a derrotar o inimigo a qualquer custo, mas a defender um reino. Portanto não se trata de estratégia de ataque, mas sim de defesa.
Quarto: as estratégias expostas em A arte da guerra não dizem respeito às individualidades (como querem fazer crer os liberais), mas às coletividades (sociedade).
Quinto: há uma longa discussão (essa é para os doutos, e não para mim) sobre a relação entre Taoísmo e Confucionismo.
Algumas publicações teimam em dizer que o Taoísmo impacta no Confucionismo.
Outras, que são sistemas filosóficos antagônicos, mas muito impactantes na China antiga e atual.
Por exemplo (argumentam), as camadas mais cultas e urbanas chinesas seriam confucionistas (inclusive os membros do Partido Comunista chinês), enquanto o campesinato seria taoísta.
Sexto: o que se pode dizer com bastante segurança é que o Taoísmo impactou no Budismo (originário da Índia) dando origem ao zen-budismo
O que é o taoísmo
O taoísmo surgiu na China durante a dinastia Han (206 a.C. até 220 d.C). A origem do componente filosófico do taoísmo é atribuída ao filósofo chinês Lao Tse, que viveu no século VI a.C.
Primados do taoísmo
– Tao (caminho) é a única fonte do universo;
– A vida é regida por dois elementos (dualismo): yin (feminino) e yang (masculino). Estas duas forças se complementam e não podem existir uma sem a outra;
– As atitudes humanas devem estar sempre de acordo com a natureza;
– O ser humano deve buscar o equilíbrio do corpo e deste com a natureza;
– O ser humano deve buscar o desprendimento do mundo material, não devendo desejar nada.
– Quando um desejo é satisfeito, outro aparece em seu lugar.