
Quando surgiram, semana passada, as primeiras informações dando conta de que o jornalista Luiz Nassif entrevistaria a presidente Dilma Rousseff para a TV Brasil, se iniciou, de imediato, uma espécie de campanha para o acompanhamento da matéria que iria ao ar ao vivo, no domingo que passou.
Alertei que não estava previsto o “ao vivo” e que a direção da emissora, por prudência, estava estudando quando colocá-la no ar.
Havia, ainda, uma segunda questão (e a mais importante) a ser ponderada: a suspensão do contrato de Nassif com a EBC (Empresa Brasileira de Comunicação).
Com contrato suspenso, Nassif não poderia levar adiante a jornada, a não ser como convidado, o que, evidentemente, não era o caso.
Das finuras
Ricardo Melo, o presidente da estatal de comunicação, foi demitido pelo governo interino em ato arbitrário e unilateral, e, no entendimento geral, como ato revanchista, posto fosse ele gente ligada à presidente afastada.
Melo reagiu, o conselho da estatal protestou e o STF garantiu a recondução do jornalista à presidência da empresa.
A decisão de Melo, de permitir a entrevista com Dilma (não se sabe como e com quem isso foi costurado), pode ser vista de duas formas:
– de rebeldia contra o unilateralismo do interinato, que não só o dispensou da empresa, como também suspendeu vários programas, entre eles o de Luiz Nassif;
– de resistência, como forma de salvaguardar a independência (questionável, diga-se) tanto da EBC, quanto da TV Brasil.
Sem que se tire do contexto uma possível forte pressão do governo interino (não se tem, ainda, certeza disso, mas é muito provável que tenha ocorrido), a “iniciativa” de Melo e Nassif parou após o presidente ter se reunido com o sindicato de profissionais da empresa pública.
A exibição da entrevista está (pelo menos temporariamente) suspensa.
Salvo melhor juízo, o sindicato apoia Ricardo Melo e a sua recondução à presidência da estatal.
Dos entendimentos
Há duas questões importantes a serem vistas a partir daqui: a legal e a censória.
A demissão de Melo, a sua recondução à presidência da EBC e a suspensão de contratos, entre eles o de Luiz Nassif, estão sub judice, ou seja, aguardando decisão judicial.
Sob esta ótica, portanto, foi bastante prudente a decisão de Melo em suspender a exibição da entrevista com Dilma Rousseff.
Com a mesma avidez e precipitação que se teve quando anunciada a entrevista, a militância petista agora já inunda as redes sociais com comentários que vão da capitulação/traição de Melo à censura imposta pelo governo interino.
No caso, capitulação e/ou traição é/são de difícil/eis mensuração, posto serem inferências pessoais e/ou corporativas, que dizem respeito ao estado de ânimo de cada um e às suas expectativas e desejos.
Com relação à censura é preciso, para comprová-la de fato, dados mais concretos e objetivos, portanto, passível (a censura) de ser comprovada ou não.
Dos resquícios
O que fica de concreto, de objetivo nessa história toda é o papel da militância, que em auto definição tem lado, tem bandeira – ambos a serem defendidos intransigentemente sem se levar em consideração os outros aspectos de cada questão.
Muito pelo contrário: se está de nosso lado, se nos agrada, se é a nosso favor está certo, está correto; caso contrário, não.
É o típico caso de fanatismo.
E o fanatismo embute em si um problema bastante grave: a certeza de nossas posições, ao serem confrontadas e derrotadas, nos leva à depressão e à raiva.
Necessariamente há que se entender que esse desvio de caráter está ligado a:
– nossa incapacidade de discernimento e isenção;
– não termos argumentos baseados em informações sólidas e incontestáveis;
– ausência de uma formação ideológica e política mais sólida e consistente.