
Quando eu era molequinho, lá pelos 10/11 anos até mais ou menos os 15, muitos/as dos/as meus tios e minhas tias e alguns/mas primos/as (já maiorzinhos/as) trabalhavam em fábricas.
Vira e mexe as fábricas estavam paradas. Esses meus parentes e o restante da peãozada faziam greve porque o “patrão” atrasava 3 ou 4 meses o salário, o que, às vezes, chegava a seis meses.
A polícia sempre estava por lá.
“Baixava a borracha” (como se dizia na época) nos grevistas que não queriam deixar outros trabalhadores entrarem na fábrica para trabalhar.
Esses trabalhadores que queiram trabalhar durante a greve eram conhecidos como “fura-greve” e “pelego”.
Tinha duas coisas que eu não entendia direito na época:
– quem chamava a polícia para se meter na história? Seriam os trabalhadores que queriam trabalhar ou alguém que passava pela rua da fábrica e ficava preocupado com o empurra—empurra entre a peãozada?
– por que a polícia sempre aparecida para bater nos trabalhadores que queriam fazer greve e não queriam que os outros trabalhadores voltassem “às máquinas”, mas nunca aparecia para exigir do “patrão” que ele pagasse os atrasados aos trabalhadores?
Das lerdezas
Eu sempre fui um cara meio lerdo pra perceber as coisas. De mais a mais, nessa época, eu era um menino bastante tímido.
Se um bebê olhasse pra mim por mais de 10 segundos eu ficava todo vermelho e suava um bocado.
Imagine então se eu teria coragem de fazer essas perguntas pra quem quer que fosse?
Mas também tinha eu razões bastante sólidas para não fazer as tais perguntas.
Um de meus tios fora comunista, filiado ao Pecebão (Partido Comunista brasileiro), mas antes fora anarquista.
Imagine que viviam dizendo pra ele ir embora pra Rússia (era a URSS, mas eu também achava que era a Rússia), pois lá os comunistas jogavam as criancinhas pra cima e as espetavam na baioneta.
Meu tio tinha uma porção de filhos/as na época – de minha idade pra baixo.
Ele resolveu se conter nos seus discursos e nas suas reclamações contra os patrões e o “sistema capitalista”.
E eu, então, com aquela idadezinha? Se perguntasse e eles me mandassem pra Rússia, o que iria ser? Na certa seria passado na baioneta também. E justo eu que nem comunista era!
Das moralidades
Essas duas figuras da foto acima, atrás do policial, resolveram protestar contra a presença, nas ruas, da atriz Letícia Sabatella.
Isso aconteceu em Curitiba, ontem, e os dois disseram cobras e lagartos para a atriz, coisas, por exemplo, como “puta” e “vagabunda”.
Bem, eu não tenho mais 10/15 anos, não sou mais tímido há um bocado de tempo e sou daquele tipo de cara chato que questiona a tudo e a todos, mas algumas coisas continuo não entendendo.
O que a polícia estava fazendo nas ruas de Curitiba durante as manifestações?
Protegendo alguém? Protegendo alguma coisa?
Ofender moralmente uma pessoa não é, no mínimo, razão para enquadrar os ofensores no código civil?
Quem sabe prendê-los, ou, vá lá, pelo menos admoestá-los e repreendê-los?
Ou quem sabe fosse o caso de “baixar a borracha” na Letícia Sabatella e até prendê-la.
Assim como a peonada dos anos 60, quem sabe fosse ela quem estivesse a tumultuar a pacatez curitibana?
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