[A esquerda brasileira parece estar numa “bolha” e, em geral, suas discussões “giram em torno” de saber quem estará no comando nos próximos anos, “se haverá uma renovação dentro do PT, se será criado um novo partido, ou se o PSOL vai crescer. Mas todas essas discussões dão a impressão de serem cada vez mais marginalizadas, (…) sem conexão com a classe trabalhadora”, “sem uma real conexão com a sociedade”, constata o antropólogo argentino Salvador Andrés Schavelzon [1].
Na entrevista a seguir, concedida pessoalmente à IHU On-Line, quando esteve no Instituto Humanitas Unisinos – IHU, participando do Ciclos de Estudos Metrópoles, Políticas Públicas e Tecnologias de Governo. Territórios, governamento da vida e o comum, Schavelzon comentou o resultado das eleições municipais no país. Na avaliação dele, “o fenômeno importante dessas eleições” é o fato de que “as maiorias e as classes populares subalternas ou votam na direita ou não votam”, o que confirma a tese de que a esquerda, cada vez mais, “é uma expressão da classe média progressista”.
Segundo Schavelzon, apesar de todas as críticas que podem ser dirigidas ao governo Temer, especialmente por conta da PEC 241, “infelizmente não conseguimos falar de 2015 como um momento totalmente diferente do que o momento que estamos vivendo agora”. E adverte: “Para entender as políticas conservadoras atuais, não podemos começar a discutir 2016 como a chegada de um momento totalmente novo. É interessante nos perguntarmos por que a esquerda fez as escolhas que fez e chegou a esse momento”. E dispara: “Se a esquerda pensa que não existem mais possibilidades, ela pode voltar para casa”.
A proposta da Reforma da Previdência, que sugere o aumento da idade mínima para a aposentadoria, diz, “é do governo Dilma” e a “desvinculação da obrigação de um gasto social – que aparece também na PEC 241 – já tinha antecedentes no governo Dilma. Então, a polarização, que em tempo de eleições e também no processo de impeachment ficou em primeiro plano, esconde um consenso e uma transversalidade entre os governos, porque, evidentemente, a prioridade do PT não foi colocar um antagonismo entre trabalho e capital no primeiro plano”.
Para ele, uma alternativa à política atual não será encontrada “dentro do sistema político” e também “não está entre os intelectuais à esquerda ou no progressismo de classe média”. Para encontrar uma saída, frisa, “é preciso que os setores e as maiorias que hoje não estão participando da política, participem; essa é a possibilidade”. E comenta: “Hoje eu vejo que encontramos potência e vida nessas lutas urbanas e nas lutas que não são divulgadas, como a luta contra o desenvolvimento nos territórios, a luta dos povos indígenas que estão resistindo à ocupação de territórios pelo agronegócio”.]
Leia a íntegra da entrevista no site IHU.Unisinos.
[1] Salvador Schavelzon é argentino e atualmente leciona na Universidade Federal de São Paulo. É doutor em Antropologia Social pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, mestre em Sociologia e Antropologia pela UFRJ e graduado em Ciências Antropológicas pela Universidad de Buenos Aires. Sua tese de doutorado, intitulada A Assembleia Constituinte da Bolívia: Etnografia de um Estado Plurinacional, foi publicada como livro na Bolívia em 2012, com nova versão editada em 2013, pela Clacso Coediciones. Este livro e outro, sobre Bem Viver e Plurinacionalidade na Bolívia e Equador, estão disponíveis aqui.