
Muita coisa, se não a totalidade, das feituras e promessas do vice empossado, Michel Temer, incomoda e assusta.
Um exemplo execrável do temerismo é a compressão dos investimentos em saúde pública.
Saúde pública brasileira que nunca, em tempo algum, foi exemplo para quem quer que seja, mas que nos governos petistas de Lula e Dilma ganhou um alento, por exemplo, com o programa “Mais Médicos”, com a compra de medicamentos e com a criação de novos programas de pronto atendimento à população.
No caso particular do programa “Mais Médicos” é a impressionante a tara temerista de rifar, “em cinco anos”, a presença de profissionais cubanos do território nacional.
Os cubanos são piores ou melhores que, por exemplo, os médicos brasileiros?
Não sei dizer. Mas essa fissura temerista cheira a ódio e nos faz retornar à guerra fria.
Que tal prender e confinar os médicos cubanos em alguma masmorra brasileira?
A partilha do petróleo brasileiro também é outra história bastante mal explicada pelo temerismo (se é que ele explica alguma coisa).
Já se expôs por aqui, em diversas ocasiões, a antipatia pelas teses nacionalistas, tipo “o petróleo é nosso”.
E, acrescente-se: em tempo algum a cadeia produtiva de “o petróleo é nosso” foi totalmente nacional/estatal. Muito pelo contrário.
Também nunca se entrou por aqui nesses contos da carochinha de soberania nacional, e investimentos na saúde e na educação, e em outras patacoadas do gênero.
O que tem de se ver, no entanto, são os interesses, primeiro, da população nacional, e, segundo, dos Estados ditos produtores de petróleo.
E isso o temerismo não está vendo e/ou não quer ver.
Dos PECados
O que está pegando, neste momento, é a tal da PEC 241 (na Câmara) / PEC 55 (no Senado), que altera o “regime fiscal” do Estado brasileiro e coloca teto nos investimentos da União.
Numa coisa o temerário tem razão: a maioria, se não a totalidade dos críticos da PEC, não a leu e não sabe ao certo do que se trata.
Suas virtudes, porém, terminam por aí.
Grosso modo a PEC propõe um congelamento dos investimentos, qual seja, os recursos serão corrigidos apenas pelo índice inflacionário.
A gente já sabe no que isso vai dar, basta ver o que acontece, por exemplo, com a correção dos salários do trabalhador.
Fosse apenas isso já era ruim; mas não se iludam: é pior ainda.
A criação de teto vai fazer retornar os investimentos há anos anteriores, o que quer dizer, na prática, que o país terá menos investimentos do que se previa até a decapitação final de Dilma Rousseff.
E caso típico, como se verá nas duas matérias lincadas que seguem abaixo, é o da ciência, tecnologia e inovação (isso para não falarmos diretamente da educação, outra hecatombe prometida pelo temerismo e por essa coisa esdrúxula chamada “escola sem partido”).
Vamos virar todos zumbis, dependentes que ficaremos de saquinhos de sangue e de nacos de carnes putrefatas ofertadas pelo capitalismo central (EUA, Japão e Europa)?
É exatamente esse horizonte que o temerismo está propondo para todos nós brasileiros.
Não se espantem se, dentro em breve, iniciar-se uma nova evasão de cérebros brasileiros rumo ao exterior.
Vejam as matérias prometidas acima
“PEC dos Gastos Públicos impactará a CT&I brasileira”
[Desde que chegou ao poder, há cinco meses, o governo do presidente Michel Temer iniciou um trabalho de análise das contas públicas. Como era esperado, o rombo deixado pela gestão anterior atingiu R$ 170 bilhões. O remédio desenvolvido para enfrentar esse déficit fiscal é a polêmica Proposta de Emenda Constitucional (PEC) dos Gastos Públicos, que congela as despesas do Governo Federal, com cifras corrigidas pela inflação, por até 20 anos.
Muitas contas já foram feitas para determinar o impacto dessa proposta em diferentes setores da economia brasileira. Mas os estudos para medir a força dessa medida na área de ciência, tecnologia e inovação (CT&I) ainda não foram mensurados. O fato é que se aprovada pelo Senado Federal, a proposta irá congelar o pior orçamento público federal dos últimos sete anos: R$ 4,6 bilhões, aproximadamente 40% menor do investimento em 2013.
A medida também impactará os sistemas estaduais de CT&I, sobretudo no orçamento das Fundações de Amparo à Pesquisa (FAP), que também têm receitas com vinculação constitucional. As FAP financiam importantes projetos de pesquisa básica e aplicada, além de custear a manutenção e aprimoramento da infraestrutura laboratorial dos estados.
Para o economista Luiz Antonio Elias, a PEC provocará uma “restrição orçamentária violenta e significativa” em todos os entes da federação. “De 2003 a 2012, nos elevamos a nossa capacidade de manufatura e retrocedemos quando a crise chegou. Estamos vivendo uma nova revolução industrial, o surgimento da Indústria 4.0 ou Manufatura Avançada, e se a PEC for aprovada estaremos cada vez mais distantes dela. O motor da economia é o investimento. E a PEC restringe investimentos”, afirmou o Elias, que foi secretário executivo do então Ministério da Ciência e Tecnologia, de 2007 a 2014.
Ele foi um dos palestrantes da mesa de abertura do Fórum RNP, que acontece em Brasília, e é realizado em parceria com o Conselho Nacional dos Secretários Estaduais para Assuntos de CT&I (Consecti). Para Elias, o atual governo não deveria enxergar os investimentos em C&T, Educação e Saúde como gastos públicos.
“A PEC ocasionará uma série de restrições, especialmente em Saúde e Educação, que são parceiros da CT&I. A PEC não é somente uma questão orçamentária fiscal. Ela é, estruturalmente, um novo redesenho da questão do Estado, que terá implicações significativas no tocante à capacidade de recursos para implementar a agenda de C&T”, disse o economista.
De acordo com pesquisadores do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos, se a PEC estivesse em vigor desde 2002, o País teria deixado de investir cerca de R$ 377,7 bilhões, em educação até 2015. O valor representa 40% do montante total aplicado neste período.
Em nota, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) avaliam que o investimento brasileiro em pesquisa e desenvolvimento pode reduzir de 1,1% do PIB para cerca de 0,8% do PIB. Segundo as entidades, o sucesso da PEC 241 está vinculado a um crescimento da economia brasileira acima de 2,5% ao ano.
“Na economia do conhecimento, não há produtividade e nem novos produtos sem uma base científica e tecnológica forte, que produza pessoal qualificado, conhecimentos avançados sobre processos e produtos, e pesquisas que se transformam em inovação nas empresas. Com limitado suporte à CT&I, a PEC 241 tende a naufragar em dez anos”, diz um trecho da carta. “O orçamento da CT&I brasileira foi extremamente reduzido nos últimos três anos. Congelar o orçamento dessa área significa sentenciar as chances de desenvolvimento da economia à estagnação.”
Veja a íntegra da carta neste link.]
(Felipe Linhares, da Agência Gestão CT&I)
“Entidades de C&T temem por mais burocracia com rebaixamento do CNPq e Finep”
[Agências importantes de fomento à pesquisa, como o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), sempre ficaram próximas do centro das tomadas de decisão do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). Mas com o decreto nº 8.877, aprovado em 18 de outubro, mudanças foram realizadas no organograma da pasta, com as agências agora subordinadas a uma “Coordenação Geral de Serviços Postais e de Governança e Acompanhamento de Empresas Estatais e Entidades Vinculadas”.
A reestruturação foi mal recebida por várias entidades do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I), que enviaram cartas ao ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Gilberto Kassab, se manifestando contra a mudança. Entre elas, o Conselho Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de Ciência, Tecnologia e Inovação (Consecti) e o Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (Confap), cuja carta assinada por ambas será oficialmente entregue a Kassab nesta quarta-feira (9).
Segundo a presidente do Consecti, Francilene Garcia, houve um nítido rebaixamento da vinculação do CNPq e da Finep com o ministério, pois eles passaram agora a ser subordinados a uma coordenação, que responde a uma diretoria, que presta contas à Secretaria Executiva do MCTIC. Para Garcia, esse distanciamento com o poder de decisão do ministro implica em uma maior burocracia nos processos, motivo de críticas da comunidade científica pelos elevados custos e atrasos que proporcionam aos pesquisadores brasileiros.
“Essas agências têm sido fundamentais para que as ações de fomento cheguem à ponta, nos que mais precisam. Esse rebaixamento é inoportuno, politicamente e estrategicamente, no sentido que a operação vai ser cada vez mais lenta ao nosso ver [do Consecti e do Confap]”, afirmou Francilene Garcia durante o Fórum RNP, realizado em Brasília (DF) até esta quinta-feira (10).
Garcia acredita que a subordinação do CNPq e da Finep a essa coordenação dificultará a discussão das ações de fomento das agências, o equacionamento dos contingenciamentos orçamentários, além de atrasar a atuação delas de forma descentralizada nos estados. “Na visão do Consecti e do Confap é necessário, sobretudo em época de crise, que essas agências continuem vinculadas a um órgão estratégico e a seu ministro especificamente, que toma a decisão”, alertou.
De acordo com Francilene, representantes do MCTIC asseguraram que as mudanças estariam vinculadas somente a questões operacionais, no que diz respeito ao corpo técnico das duas agências, e a outras ações dentro da estrutura orgânica do governo. “Mas acreditamos que na medida em que essa lógica de discussão passe por essa coordenação é natural que os assuntos estratégicos, orçamentários, de novas iniciativas de programas importantes acabem caindo no mesmo meio.”
Como o decreto foi publicado em 19 de outubro, a presidente do Consecti espera que as mudanças ainda estejam em fase de implantação, com possibilidade de não serem de fato efetivadas caso Gilberto Kassab atenda ao pleito das entidades de CT&I. “Vamos esperar que o ministro reconsidere a vinculação do CNPq e da Finep diretamente a ele”, pontuou.
Na carta, Consecti e Confap ressaltam que “o rebaixamento implicará em ainda maior ineficiência, totalmente na contramão do que preconiza as melhores práticas administrativas na gestão da ciência, tecnologia e inovação no resto do mundo”.
Mais entidades
A Academia Brasileira de Ciências (ABC), a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Sociedade Brasileira de Física (SBF) e representantes da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) também divulgaram cartas, reiterando as críticas sobre as mudanças. A íntegra delas está disponível neste link.
As mudanças propostas no novo organograma também afetam a Agência Espacial Brasileira (AEB) e a Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen). “CNPq, Finep, AEB e Cnen têm história, tamanho e missões que vão muito além de uma coordenação subordinada a uma diretoria que responde à Secretaria Executiva do MCTIC”, pontuou um trecho da carta da SBPC. “Colocá-los sob uma coordenação de quarto nível do MCTIC é não reconhecer a importância da CT&I para o País e para a sociedade brasileira”, advertiu.
Em nota, o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações declarou que recebeu a manifestação das organizações e pretende aproveitar as sugestões para o aperfeiçoamento da estrutura da pasta, que deve ocorrer até o início de 2017, com a publicação de um novo decreto, conforme acordado com as instituições pela Presidência da República.]
(Leandro Cipriano, da Agência Gestão CT&I)
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