O tempo urge, mas as esquerdas brasileiras teimam em discutir miolo de pote

Projeto Calha Norte
Reprodução

O programa Calha Norte[1], de meados anos 80, causou bastante desconforto ao governo ditatorial, aos governos estaduais, compreendidos em sua área, e às esquerdas nacionais.

A ditadura teve de conviver com a desconfiança de países vizinhos (expansionismo territorial), mas também (internamente, principalmente) desconfiava-se que o governo federal não seria capaz de enfrentar a empreitada, seja pelas extensas fronteiras brasileiras, seja pela precariedade logística, seja pela falta de pessoal qualificado.

Os governos estaduais ficaram atônitos, não sabendo ao certo a que se destinava o projeto (os militares nunca foram muito de dar satisfações aos civis) e, por fim, que parte da tarefa caberia a eles.

As esquerdas, como sempre, surpreendidas e desinformadas, resgataram o seu velho discurso da invasão do capital internacional no interior do Brasil (entreguismo), nunca se dando conta de que são as esquerdas (no mundo) quem mais defendem uma integração dos povos e a derrubada das fronteiras nacionais.

Tempos mais tarde, uma ala do PT reconheceu o equívoco, mas já era tarde, pois se perdeu, mais uma vez, uma boa oportunidade para uma discussão madura e adulta sobre um interesse nacional.

A discussão sobre o Calha Norte me lembrou de outra, esta do final dos anos 50 inicio dos 60, sobre uma ligação que “cortava” o Brasil ao meio, de norte a sul, qual seja a rodovia Belém- Brasília.

As esquerdas também daquela vez se adiantaram em críticas à rodovia (governo Juscelino Kubitschek), temendo que estavam, igualmente, do avanço do capital pelo interior do Brasil.

Como se vê, o discurso esquerdista muda muito pouco,ou quase nada.

Trabalhei por 10 meses no município amazonense do Envira, que estava compreendido no interior do Projeto.

Num dia qualquer (de 1985), sem que o prefeito e o vice estivessem presentes, nos apareceu no Envira cinco militares (dois do exército e três a aeronáutica) e eu tive de recepcioná-los.

Tentei não externar as minhas críticas nem minhas desconfiança com o projeto, mas essa gente é bastante experiente, e logo supuseram que eu fosse “de esquerda”.

Não houve nenhum embate ideológico entre eles e eu e a única preocupação que externaram (além de buscar um bom campo de pouso para as aeronaves do projeto) foi com o nascente Partido dos Trabalhadores, que já naquela época causava preocupação e desconfiança.

Os esquerdistas parecem esquecer que os militares brasileiros são extremamente nacionalistas e em muitos momento mais nacionalista, por exemplo, que Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, vide o caso do marechal e indigenista Cândido Mariano da Silva Rondon [2], um positivista [3], que inclusive influenciou fortemente os sertanistas irmãos Villas-Boas [4] e o antropólogo Darcy Ribeiro [5] .

Márcio Tadeu dos Santos

Notas

[1] O Programa Calha Norte (PCN) foi criado em 1985 pelo Governo Federal diante de uma preocupação dos militares sobre a causa amazônica. Naquela época, se propagava a cobiça internacional sobre as reservas naturais estratégicas do país.

Desde 1999 sob a coordenação do Ministério da Defesa, o Calha Norte tem o propósito de promover a ocupação e o desenvolvimento ordenado e sustentável da região amazônica. O programa abrange 379 municípios, distribuídos em oito estados: Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul (faixa de fronteira), Pará, Rondônia e Roraima.

Ao todo, são quase nove milhões de brasileiros beneficiados, incluindo 46% da população indígena – em uma área que corresponde a 44% do território nacional.

Link: https://www.defesa.gov.br/index.php/programas-sociais/programa-calha-norte

[2] Cândido Mariano da Silva Rondon, mais conhecido como Marechal Rondon (Santo Antônio de Leverger, 5 de maio de 1865Rio de Janeiro, 19 de janeiro de 1958), foi um militar e sertanista brasileiro.

De origem indígena por parte de seus bisavós maternos (Bororó e Terena) e bisavó paterna (Guará), Rondon tornou-se órfão precocemente, tendo sido criado pelo tio e, depois de sua morte, transferiu-se para o Rio de Janeiro para ingressar na Escola Militar desta cidade,[1] pois além dos estudos serem gratuitos, os alunos da escola recebiam, desde que assentassem praça, soldo de sargento.

Alistou-se no 3º Regimento de Artilharia a Cavalo em 1881. Dentre outros estudos, cursou Matemática e Ciências Físicas e Naturais da Escola Superior de Guerra.[1]

Ainda estudante, teve participação nos movimentos abolicionista e republicano. Foi nomeado chefe do Distrito Telegráfico de Mato Grosso.[1] Foi então designado para a Comissão de Construção da linha telegráfica que ligaria Mato Grosso e Goiás.

Link https://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%A2ndido_Rondon

[3] Sistema criado por Auguste Comte 1798-1857 que se propõe a ordenar as ciências experimentais, considerando-as o modelo por excelência do conhecimento humano, em detrimento das especulações metafísicas ou teológicas; comtismo.

Link https://www.google.com/search?q=Positivismo&ie=utf-8&oe=utf-8&client=firefox-b-ab

[4] Os Irmãos Villas-Bôas: Orlando (1914-2002), Cláudio (1916-1998) e Leonardo Villas-Bôas (1918-1961), foram importantes sertanistas brasileiros.

Orlando, Cláudio e Leonardo tomaram parte desde as primeiras atividades da vanguarda da Expedição Roncador-Xingu criada pelo governo federal no início de 1943 com o objetivo de conhecer e desbravar as áreas mostradas em branco nas cartas geográficas brasileiras. O índio apareceria, mais tarde, diante da expedição como um “obstáculo”.

Posteriormente foram designados chefes da expedição. Em face disso foram acelerados todos os trabalhos em andamento, possibilitando assim que fosse vencida a grande e difícil etapa (Rio das Mortes – Alto Xingu). A segunda etapa, ainda mais longa (Xingu – Serra do Cachimbo – Tapajós), deixou no roteiro uma dezena de campos de pouso. Alguns desses campos – Aragarças, Barra do Garças, Xavantina, Xingu, Cachimbo e Jacareacanga, foram mais tarde transformados em Bases Militares e em importantes pontos de apoio de rotas aéreas nacionais e transcontinentais pelo Ministério da Aeronáutica. Outros campos intermediários como o Kuluene, Xingu, Posto Leonardo Villas-Bôas, Diauarum, Telles Pires e Kren-Akôro, tornaram-se postos de assistência aos índios.

Link https://pt.wikipedia.org/wiki/Irm%C3%A3os_Villas-B%C3%B4as

[5] Darcy Ribeiro, antropólogo, educador e romancista, nasceu em Montes Claros (MG), em 26 de outubro de 1922, e faleceu em Brasília, DF, em 17 de fevereiro de 1997. Eleito em 8 de outubro de 1992 para a Cadeira nº 11, sucedendo a Deolindo Couto, foi recebido em 15 de abril de 1993, pelo acadêmico Candido Mendes de Almeida.

Diplomou-se em Ciências Sociais pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo (1946), com especialização em Antropologia. Etnólogo do Serviço de Proteção aos Índios, dedicou os primeiros anos de vida profissional (1947-56) ao estudo dos índios de várias tribos do país. Fundou o Museu do Índio, que dirigiu até 1947, e colaborou na criação do Parque Indígena do Xingu. Escreveu uma vasta obra etnográfica e de defesa da causa indígena. Elaborou para a UNESCO um estudo do impacto da civilização sobre os grupos indígenas brasileiros no século XX e colaborou com a Organização Internacional do Trabalho na preparação de um manual sobre os povos aborígenes de todo o mundo. Organizou e dirigiu o primeiro curso de pós-graduação em Antropologia, e foi professor de Etnologia da Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil (1955-56).

Diretor de Estudos Sociais do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais do MEC (1957-61); presidente da Associação Brasileira de Antropologia. Participou com Anísio Teixeira, da defesa da escola pública por ocasião da discussão de Lei de Diretrizes e Bases da Educação; criou a Universidade de Brasília, de que foi o primeiro reitor; foi ministro da Educação e chefe da Casa Civil do Governo João Goulart. Com o golpe militar de 64, teve os direitos políticos cassados e se exilou.

Viveu em vários países da América Latina, conduzindo programas de reforma universitária, com base nas idéias que defendeu em A Universidade necessária. Professor de Antropologia da Universidade Oriental do Uruguai; foi assessor do presidente Salvador Allende, no Chile, e de Velasco Alvarado, no Peru. Escreveu nesse período os cinco volumes dos estudos de Antropologia da Civilização (O processo civilizatório, As Américas e a civilização, O dilema da América Latina, Os brasileiros – 1. Teoria do Brasil e Os índios e a civilização), nos quais propõe uma teoria explicativa das causas do desenvolvimento desigual dos povos americanos.

Ainda no exílio, escreveu dois romances: Maíra e O mulo, aos quais acrescentou, mais tarde, Utopia selvagem e Migo. Publicou Aos trancos e barrancos, que é um balanço crítico da história brasileira de 1900 a 1980. Publicou também a coletânea Ensaios Insólitos e um balanço da sua vida intelectual: Testemunho. Editou, juntamente com Berta G. Ribeiro, a Suma etnológica brasileira. Publicou, pela Biblioteca Ayacucho, em espanhol, e pela Editora Vozes, em português, A fundação do Brasil, um compêndio de textos históricos dos séculos XVI e XVII, comentados por Carlos Moreira e precedidos de longo ensaio analítico sobre os primórdios do Brasil.

Em 1976, retornou ao Brasil, e foi anistiado em 1980. Voltou a dedicar-se à educação e à política. Participando do PDT com Leonel Brizola, foi eleito vice-governador do Estado do Rio de Janeiro (1982). Foi cumulativamente secretário de Estado da Cultura e coordenador do Programa Especial de Educação, com o encargo de implantar 500 CIEPs no Estado do Rio de Janeiro. Criou também a Biblioteca Pública Estadual, a Casa França-Brasil, a Casa Laura Alvim e o Sambódromo, em que colocou 200 salas de aula para fazê-lo funcionar também como uma enorme escola primária.

Em 1990, foi eleito senador da República, função que exerceu defendendo vários projetos, entre eles uma lei dos transplantes que, invertendo as regras vigentes, torna possível usar os órgãos dos mortos para salvar os vivos. Publicou, pelo Senado Federal, a revista Carta, onde os principais problemas do Brasil e do mundo são analisados e discutidos.

Entre suas atividades conta-se haver contribuído para o tombamento de 98 quilômetros de belíssimas praias e encostas, além de mais de mil casas do Rio antigo. Colaborou na criação do Memorial da América Latina, edificado em São Paulo com projeto do arquiteto Oscar Niemeyer. E mereceu títulos de Doutor Honoris Causa da Sorbonne, da Universidade de Copenhague, da Universidade do Uruguai, da Universidade da Venezuela e da Universidade de Brasília (1995).

Entre 1992 e 1994, ocupou-se de completar a rede dos CIEPs; de criar um novo padrão de ensino médio, através dos Ginásios Públicos; e de implantar e consolidar a nova Universidade Estadual do Norte Fluminense, com a ambição de ser uma Universidade do Terceiro Milênio.

Em 1995, lançou seu mais recente livro, “O povo brasileiro”, que encerra a coleção de seus Estudos de Antropologia da Civilização, além de uma compilação de seus discursos e ensaios intitulada O Brasil como problema. Lançou, ainda, um livro para adolescentes, Noções das coisas, com ilustrações de Ziraldo, considerado, em 1996, como altamente recomendável pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil.

Em 1996, entregou à Editora Companhia das Letras seus Diários índios, em que reproduziu anotações que fez durante dois anos de convívio e de estudo dos índios Urubu-Kaapor, da Amazônia. Seu primeiro romance, Maíra, recebeu uma edição comemorativa de seus 20 anos, incluindo resenhas e críticas de Antonio Callado, Alfredo Bosi, Antonio Houaiss, Maria Luíza Ramos e de outros especialistas em literatura e antropologia. Ainda nesse ano, recebeu o Prêmio Interamericano de Educação Andrés Bello, concedido pela OEA.

Link http://www.academia.org.br/academicos/darcy-ribeiro/biografia

 

 

 

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s